domingo, 26 de abril de 2009

Suíte floral

Uma das coisas mais linda que vi na vida: Suíte floral – As quatro estações. Um quarteto de músicos fantásticos à esquerda e solos e pas de deux de incríveis bailarinos à direita. Os músicos: Lilian Barretto (piano), Cristiano Alves (clarineta), Hugo Pilger (violoncelo) e André Boxexa (percussão). Os bailarinos: Ana Botafogo e Joseny Coutinho.

Antecipadamente, já estava convicta que assistiria a um espetáculo estupendo. Mas nem a imaginação alcançou o encanto de vê-los e ouvi-los no palco. Ficava sem saber a que lado prestava mais atenção. Deixava, então, os ouvidos em alerta e mirava os pés e movimentos tão leves e delicados.

Esta foi apenas a segunda vez que tive o privilégio de ver a bailarina deslizar sobre as sapatilhas. Vê-los dançarem ao som de Águas de março e Eu sei que vou te amar foi uma emoção única. Era como se um conto de fadas transcorresse à minha frente. Se tivesse e estivesse à venda um DVD, teria passado o restante da noite vendo e revendo, vendo e revendo.

E não dá pra não falar do belo Joseny Coutinho. Uma sensualidade que não se encontra nas ruas, nas passarelas, nas telas. É uma coisa das estrelas, dos sonhos, de palco. E me faltam palavras para falar dele, dela, deles todos...

sábado, 25 de abril de 2009

O leitor


O leitor é um belo filme. A sensação que o enredo provoca é semelhante a de outra película, A vida dos outros. Longas-metragens que tocam intimamente, talvez pela esperança com um gesto mínimo de humanidade que se vê perdida a olha nu no dia-a-dia. A obra de Stephen Daldry revela generosidade apesar do envolvimento em circunstâncias onde normalmente não haveria qualquer sentimento de compaixão, onde o desprezo costumaria ser coadjuvante ou ator principal.

Kate Winslet e David Kross estão admiráveis numa história que emociona, sem qualquer pieguice, numa espécie de pureza de sentimentos, conciliações e reconciliações. Isso tudo em contraposição ao Holocausto, na participação do genocídio que marcou a história mundial. E um caso de amor que marcou e problematizou a história dos protagonistas para sempre.

Difícil que isso possa ocorrer na atualidade, mas é recompensador que pelo menos tenha existido na mente do escritor e tenha sido adaptado para o cinema. Cenas de leitura de inúmeros livros a uma analfabeta, da visita aos campos de concentração, da gravação de leituras de obras depois de ter sido presa, do encontro após tantos anos, dos pés em cima de pilhas de tomos, o intuito de recompensar a perda causada por um amor do passado. Imagens simples que surpreendem o olhar sedento de surpresas. Simples, mas sensíveis.

“A sociedade acredita que é guiada pela moralidade, mas isto não é verdade.” Esta é uma das assertivas do filme, mas será? A sociedade seria guiada pelas leis, como propõe o filme? Eu, particularmente, acredito que a sociedade seja guiada a partir dos umbigos que cada um mira a todo instante, segundo suas próprias leis, morais, princípios e consciências.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Um degrauzinho acima

Há tempos algo não me encanta profundamente. Algo, digo, em termos culturais. Não gostei nenhum pouco de A história do pranto, de Alan Pauls. Talvez tivesse me encantado pela beleza do autor em fotografias de resenhas de jornal. Me perdia no texto, não via importância nas palavras, mas não me permitia largar o livro sem ler até o fim.

Então, finalmente, decido ler um autor que sempre quis ler: Gabriel García Márquez. Não gastaria dinheiro para comprar porque este era uma das coisas que uma pessoa em mudança diria que “daria fim”. “Não, não jogue fora, me dê”. Comecei a ler Memórias de minhas putas tristes e me encantei por não me perder na trama e com a “candura” da história.

Pagamento de IPVA e outros gastos com o “meu neguinho” (apelido carinhoso dado a uma das raras conquistas em 27 anos) me impedem de passar o cartão na Livraria Cultura. Então, um livro, presente na estante do corredor, que sempre me apavorou pelo tamanho e pelo título esteve em minhas mãos por longo período. Cem anos de solidão me divertiu no início e me transtornou em algumas partes.

Depois, decido ler mais um autor dos tempos atuais. Não sei porque, mas os livros que sempre figuravam em minhas leituras eram os considerados clássicos, autores consagrados no mundo e na história da literatura. Decido, então, por influência de uma doce, querida, admirada amiga e devoradora de livros, ler Milton Hatoum. Um autor que eu soube, pela primeira vez, por meio de uma tese analisada em conjunto com o “meu escritor”, Samuel Rawet.

Li matérias a respeito dele e assisti a entrevistas com o manauense, e me encantei. Figurinha adorável. Atraída por títulos, vou à Livraria e escolho Dois irmãos. Não, não me apeteceu os nomes Cinzas do norte ou Relato de um certo Oriente. Dois irmãos pulou em minha frente perante os outros da estante. Deliciosamente escrito, trama interessante. Interrompo para buscar uma certa ajuda em outro livro.

Concomitantemente, tento ir a shows. Digo “tento” porque me obrigo a ser Buendía pelo menos uma vez por semana, mais do que isso é penitência. Entrevistar o João Cavalcanti, filho do “meu” Lenine, e ver o show do Casuarina foi gostoso, mas me faltava o ânimo verdadeiro dos pés irrequietos. Falar com Chico Pinheiro ao telefone e vê-lo depois no palco do Clube do Choro foi uma sensação indescritível, pequena para outros, mas inesquecível pelo meu início.

Com Chico, tive a sensação primeira de não conhecer, ler apressadamente algo sobre, entrevistá-lo por duas vezes interrompidos pelas falhas na transmissão de voz por estar em estúdio, comparecer ao show e... “Você já falou com o Chico, Ana?”, pergunta Marco Guedes, assessor do Clube. “Ah, Marco, não, mas...”. “Chico, esta é a Ana Rita, que falou com você esta semana”. Um misto de vergonha, curiosidade, assombro, admiração, degrau acima.

Iniciação a “cara-dura”: “Oi, aqui é Ana Rita. Eu queria ver Nina Becker...” “Ok, Ana, o seu nome está na lista”. Não conhecia a cantora, a não ser pela referência à Orquestra Imperial. Em um dia atribulado por trabalho e curso, decido incorporar o sobrenome Buendía e sigo longe para assistir à cantora. Saí do Espaço sem saber que opinião ter sobre ela. Gostei da voz, mas não gostei de várias coisas. Muito barulho, brincadeiras insossas no palco, letras bobas, para não dizer pior. Mmmmmmmmmm... Não, definitivamente não gostei de Nina. Uma pena. Mas conhecer tem sido o grande combustível.

Me arrependi de não ter visto Fabiana Cozza, com quem também pude falar. Apaixonada por samba, faço download de um disco seu e simplesmente me apaixono. Não sai do aparelho de som há algumas semanas. Confesso que saber de Canto de Ossanha me fez favorável à primeira vista. E, além de tudo, com dois cubanos fazendo a releitura de uma das grandes paixões de minha vida... Cuba e Vinicius. Um sonho. Ainda prefiro a versão do poetinha-poetão, mas Cozza me surpreendeu...

Me arrependo de antemão por não poder ver Teresa Cristina. Apesar de oscilar entre admiração e “não sei do que esse homem fala”, Caetano é um dos artistas que não quero morrer sem ver. E seu show coincide de ser no mesmo dia do de Teresa. Meses antes garanto meu ingresso para assisti-lo de longe, longe... Mas morrerei tranquila por tê-lo visto. rs Mas ainda faltam tantos... Também quero presenciar o show de outro Chico, o Chico Buarque, mas, claro, sem entrevistar. Com este, eu não teria voz, pernas, neurônios, condição alguma.

Mais uma “cara-dura”. “Alô! Oi,... Será que tem como eu poder ver o espetáculo com a Ana Botafogo?” “Claro, mas não vai poder ser quinta-feira, é dia de muitos convidados. Pode ser sábado”. Então, no fim de semana, terei o imenso prazer de ver o “virtuosismo nos pés e nas teclas”. Além de ir a shows, preciso ler, ler, ler. Num dia de semana qualquer, a mesma querida amiga e devoradora de livros me entrega um presente. “Por que isso, ‘meiguinha’?” “Porque não quero só presentear em datas especiais”. Ela só não sabe o tanto que aquilo me tocou. Exigi dedicatória. Rs E, mais uma vez, ela não sabe como me tocou. Três livros ao meu lado, tantos milhares na vontade.

E tem sido assim. Descobertas maravilhosas neste 2009 que proporcionou com que eu atuasse na área que sempre desejei. Poder conversar com artistas, conhecer a cada instante, descobrir novos mundos, voltar a escrever, poder ver meu nome impresso no jornal que sempre me amedrontou. Perdi ali, ganhei aqui. E quem sabe, compareço um dia para o que fui convidada ontem ao telefone por Serjão Loroza: “Você vai lá, Rita? Pô, vai lá, tomar uma cervejinha comigo no camarim!” rs

terça-feira, 21 de abril de 2009

Flores murchas

Em um passado não muito remoto, cantei Skap, de Zeca Baleiro. Num instante subsequente, identifiquei-me com o calhamaço de Gabriel García Márquez. Deve ser aquela coisa de conhecer a escuridão a partir do que são as luzes, reconhecer o barulho porque se sabe o silêncio. O ruim em experimentar efemeridades é a insistência em se querer perpetuar o que é naturalmente fugaz.

“Você me faz parecer menos só menos sozinho/ Você me faz parecer menos pó menos pozinho”. A quem possa cantá-la frequentemente, não invejo, alegro-me. Não cobiço porque me descobri Buendía. Escapar é coisa rara, momento fugaz. Macondo é minha cidade, minha realidade. Flores de azeviche murcham em Macondo. É apenas uma questão de acostumar-me. Deixo a música para aqueles de outra linhagem, para os sonhos, para conversas lúdicas.

“Nas noites de inverno, enquanto fervia a sopa no fogão, desejava o calor dos fundos da loja, o zumbido do sol nas amendoeiras empoeiradas, o apito do trem na sonolência da sesta, da mesma forma como desejava em Macondo a sopa de inverno no fogão, os pregões do vendedor de café e as cotovias fugazes da primavera. Aturdido por duas saudades colocadas de frente uma para a outra como dois espelhos, perdeu o seu maravilhoso sentido de irrealidade até que terminou por recomendar a todos que fossem embora de Macondo, que esquecessem tudo o que ele ensinara do mundo e do coração humano, que cagassem para Horácio e que em qualquer lugar em que estivessem se lembrassem sempre de que o passado era mentira, que a memória não tinha caminhos de regresso, que toda primavera antiga era irrecuperável e que o amor mais desatinado e tenaz não passava de uma verdade efêmera”.
(Cem anos de solidão, Gabriel García Márquez)

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Corra, Rita, não corra

Hoje tento acalmar minhas pernas, que tanto têm pressa. Elas que já andaram tão esbaforidas, entre tantos compromissos de vidas alheias. Elas não mais correm. Elas me pedem calma. A sábia paciência que alcança. Sabedoria desconhecida, mas que se faz tentativa. Erros e acertos, mas tentativas. No ímpeto da impaciência, seguro-as. Impeço que saiam desbandeiradas. Não é fácil. As pernas sou eu. Eu contra minhas pernas. As pernas contra mim. Impulsos nervosos contraditórios. Elas querem correr. Eu não devo. Eu quero correr. Elas me seguram. Dizem para correr pelos sonhos... Dizem que a paciência é a grande virtude... Tento a alternativa jamais tentada. Os caminhos sempre bifurcados. Vai, não vai. Corra, ande. Diga, não diga. Esparrame-se, controle-se. Sonhe, pense. E a explosão tenta fazer com que outros céus não a enxerguem...