segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Até breve!

Uma realidade me é descida goela abaixo. Como um tijolo ou um bicho que me ocupa toda por dentro. Nada desce. Tudo quer sair. Como se meu próprio corpo rejeitasse isso que precisou entrar em mim. Sai pelos olhos e quer sair pela boca. É uma realidade que não fazia parte de mim, e agora esse bicho me come por dentro. Suas mordidas machucam. Deixo-o comer algumas partes. Outras, preciso esconder. Minhas mãos tremem. Minhas pernas tremem. Difícil ter esse bicho por dentro. Mas sei que preciso deixá-lo me morder e comer as sobras. São partes que me doem ainda mais quando ele não come. São partes que surgiram e precisam ir embora rapidamente antes que me adoeçam. Mas depois preciso matar esse bicho. Ao mesmo tempo que sei que ele me fará bem, não poderei continuar mantendo-o. Tenho receio que ele descubra algumas partes e coma-as também. Mas não sei ser sem elas. Preciso delas para continuar. Preciso ter algo por dentro. Preciso manter aquilo que ainda sou eu. Assim como esse bicho veio, ele vai embora. Ele já veio outras vezes e já foi embora outras vezes. Dessa vez, preciso manter a boca fechada para que os outros não o percebam me devorando. Dessa vez, preciso ficar com a boca fechada para que partes minhas não saiam pela boca e emporcalhem as ruas. Mas sei que sua partida é breve. Breve porque sua visita foi violenta. Ele me devora rapidamente e rapidamente estará saciado. A cada visita que me faz, ao passar dos anos, se torna mais rápida tamanha a violência com que destrói e cumpre seu papel. Não vejo a hora da sua partida e me dizer “até breve”.

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