quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Faxina

Às vezes, sentimos como se precisássemos vomitar escancaradamente. Uma vontade de colocar para fora todos os gritos, desaforos, sapos, elogios, todas as broncas, cobranças, expectativas e frustrações do passado, distante ou próximo.

É como se algo fosse nos contaminando aos poucos e chegasse ao ápice. Como se tudo isso fosse necessário para chegar aonde chegamos, mas de uma forma que nos apequena ou nos faz sentir pequenos diante do mundo, até mesmo porque somos mesmo pequenos perante o universo.

Mas é como se não precisássemos nos sentir assim porque, caso contrário, nossas atitudes de nada valeriam. De tão pequenos e, em consequência, com atos tão diminutos, seríamos, portanto, inúteis neste mundo. E vemos que mínimas ações são capazes de grandes resultados.

Tornamo-nos, de certa forma, grandes graças às coisas ruins que nos acometem e aos nossos erros. Mas é preciso também nos limpar daquilo que já foi, já passou e não voltará. Porque nada retorna. Nada será mais da mesma forma. Como disse Heráclito, “ninguém pode entrar no mesmo rio duas vezes”.

É uma espécie de assepsia necessária diariamente, inclusive para não contagiarmos pessoas que nada têm a ver com nossos problemas ou por “descontarmos” devido a outras pessoas que passaram em nossas vidas ou simplesmente porque nada nem ninguém é igual.

A minha faxina tem sido constante. Em um dia, sinto como se gritasse até ficar rouca todos os palavrões que conheço. E, no outro, trato de cuidar da minha garganta e limpar aquela raiva, tristeza ou frustração.

Muito disso vem do dito otimismo, uma palavra que nunca entendi muito bem como funciona. O pensamento positivo gera expectativas que, normalmente, geram frustrações.

Mais jovem, era a favor do pessimismo. Minha teoria era a de que, se eu esperasse o pior, nada seria tão ruim como eu tivesse imaginado. E, assim, eu não gerava expectativas e, consequentemente, não me sentiria frustrada.

Hoje, digo que sou uma pessoa realista, um meio termo entre um e outro. Mesmo que crie expectativas, até mesmo devido aos outros ou às palavras dos outros, insisto comigo mesma para me centrar e não pender ao otimismo ou ao pessimismo.

E, ainda assim, não é fácil. Devido às circunstâncias nada fáceis, nos enganamos com alguns acontecimentos. Temos mania de achar que, desta vez, será diferente, que, desta vez, nos enxergarão, que, desta vez, será melhor.

E a vida não é assim. Ela segue ao seu jeito, normalmente bem distinto aos nossos desejos. E tenho tentado respeitar o caminho que se me impõe. Em outras vezes, ela foi sábia. E tento acreditar em sua sabedoria diante das negativas e dos silêncios.

Publico no blog Quadra Zero

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