sábado, 15 de agosto de 2009

Geralda e avenca

Assim como Pedro Juan, senti-me completamente só num dia de céu azul e sem trabalho. E, apesar do brilho do sol nas nuvens e nas folhas das árvores, em mim nada brilhava. Era como se tudo estivesse ofuscado como aquela poeira que vai se acumulando nas vidraças. Então, tratei de começar o dia cuidando de mim, mas não tardou até que algo quisesse explodir por dentro. Dei-me o tempo para a explosão. Deitei por uns instantes.

Penso o que poderia fazer até o resto do dia com esta sensação que há tempos não ressurgia. Lembro do que fiz vários meses atrás e decido fazer o mesmo. Coloco um vestido, uma caneta para prender o cabelo e vou para a rua. Compro uma garrafa, não de rum, para brindar o sol que se põe e para me embriagar e afrouxar o nó que me sufoca. Coloco para gelar, ponho Buena Vista Social Club para tocar bem alto e vou para debaixo do chuveiro.

Evito me olhar no espelho, tanto por receio de não gostar do que reflito quando por medo de não me reconhecer. O banho ajuda a levar embora o que se havia incrustado sobre a pele e, aos poucos, vou amolecendo a pedra que se havia formado. Lembro do que me deixou assim e penso.

Constantemente, me engano ou deixo-me enganar com os vagões que passam pela minha estação. Às vezes, pego carona em um e volto em seguida. Às vezes, faço uma longa viagem. Mas sempre retorno. E o retorno começou a ser um pensamento recorrente. A ideia de pular daquele vagão de repente parecia-me o mais sensato. Já que fosse para regressar mais à frente que fosse logo.

Lembro do que o cubano me disse no dia anterior: “gosto de caminhar devagar, mas não consigo. Sempre ando rápido. E é um absurdo. Se estou sem rumo, para que tanta pressa? Bom, na certa por isso mesmo: estou tão apavorado que não paro de correr. Tenho medo de parar por um instante e descobrir que não sei em que porra de lugar estou”.

Corro o tempo inteiro e penso o tempo inteiro. Penso à medida que corro, corro à medida que penso. Porque nada fica, atropelo, me atropelo. O céu vai perdendo a luz e eu vou me amansando. A voz e o violão de Drexler servem como um colo numa cadeira de balanço, o colo que preciso quando deito agarrando o travesseiro. Outras cores vão tomando conta do céu e eu vou também mudando de cor. Mais uma noite, mais um dia, e eu vou voltando a mim...

Um comentário:

Fabiana Reis disse...

Foi ótimo te visitar hoje. Precisava ler palavras de alma conhecida. Precisa ler algo tão humano quanto as suas palavras para visualizar sentimentos. Suas metáforas são intensas, profundas, suaves, cruéis, elegantes e certeiras. Transmitem claramente momentos que só existem na mente e no coração.

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