sábado, 13 de julho de 2013

Até amanhã, Val!


Hoje o sábado acordou salgado. Acordo cedo. Recebo a notícia: Val faleceu esta noite. Claro que a gente não se dá conta de pronto. Val não estava doente. Val esteve conosco dois dias atrás. Um grave acidente levou o anjo de todos os dias por 12 anos desta casa. Aos poucos, me dou conta que não verei mais aquele gato em forma de gente. Era uma das coisas que eu dizia a ela. A pessoa mais discreta que conheci na vida era incapaz de qualquer incômodo. A gente, às vezes, se assustava com a sua presença porque, de tão silenciosa, não nos dávamos conta que ela já estava ali a cuidar da gente. Não que sua presença não fosse marcante, era por isso mesmo demais marcante.

Val acreditava em Deus, acreditava em sua religião, acreditava em ajudar o próximo. Por esses motivos, não veio trabalhar na sexta-feira, e não viria na segunda, porque viajaria por vários e vários quilômetros para ajudar a população de uma das regiões mais pobres deste país. Ela faleceu no meio do caminho, em direção ao que acreditava, para fazer o bem a quem não conhecia, com sua doçura, sua fé, seus dons culinários.

Eu também costumava dizer que era um dos seres mais evoluídos que conheci em meus 32 anos. Val não faltava, se atrasava era devido ao maravilhoso transporte público deste país. Morava em Planaltina de Goiás e acordava por volta das 4h para cuidar de uma família que não era a sua. Uma palavra que talvez possa chegar perto de quem era a Val era “cuidar”. Val não reclamava da vida por mais que sua coluna e sua perna doessem constantemente, por mais que seu marido e seu filho lhe dessem preocupações, por mais que o dinheiro não desse para o que precisava. Era silenciosa, mas bastava ficar um pouco ao seu lado que teria conversa por horas. Assim, descobríamos algumas de suas aflições e quando estava doente. Por volta das 15h, ela ia embora para cuidar de sua família.

Sempre tento almoçar em casa. E, durante a semana, almocei fora alguns dias, mas, na quinta-feira, fiz questão de almoçar com meus pais e comer o almoço feito pela Val. Após o almoço era quando eu me despedia da Val. Sempre dizia: “até amanhã, Val” ou “ bom fim de semana, Val. Até segunda”. Na quinta, eu falei “até amanhã, Val”. Esqueci que ela não viria no dia seguinte.

A casa está triste. O sábado acordou salgado. A segunda-feira será atípica. Os outros dias serão mais vazios e ainda mais silenciosos. Nesta casa, Val deixou apenas coisas boas, boas lembranças, muito carinho, bastante zelo, uma bíblia e suas anotações. Espero que não tenha sentido dor, que não tenha sofrido. Pelo menos isso. Espero que não tenha havido um ser humano que lhe tenha feito mal. Val só merecia as coisas boas da vida, apesar de a vida ser meio que injusta ou aparentemente injusta. Vai com Deus, Val. Acho que você gostaria de ouvir isso. Eu digo: até amanhã. Val.


2 comentários:

Anônimo disse...

Que lindo, Rita. Que Val fique em paz e que vocês e a família dela tenham força e conforto para seguir em frente. Pensei muito nela ontem e hoje. Assim como tenho pensado muito na morte. Tenho aprendido, a duras penas, que a morte faz parte da vida. E acredito que Val e TT estejam em um lugar bom, cercadas de amor, como elas merecem.

Um abraço de urso,
Flavinha.

Ana Rita Gondim disse...

No fim de semana, lembrei que, na quinta-feira, falamos tanto da TT, Flavinha... Outro anjo estava perto de partir... Como é difícil lidar com isso...
Obrigada pelo carinho, linda! Te amo!
Devolvido o abraço de urso! :*