sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Carta confessa

Caro anônimo,

Não me faças crer que o mundo é meu. São tantas as sequóias que um ponto de um raio de luz não se percebe cá embaixo. Olho para o alto e vejo tanta altura, tanta robustez. Aqui, entre gamíneas, sinto-me igual, crescendo junto, e, mesmo entre elas, há os capins que crescem instintivamente, ininterruptamente.

Não me conheces, não sabes quem sou. Não entendes meus medos ou minhas angústias. Sei que devo enfrentar e adubar-me, mas isso requer tempo. Preciso encher a mala que carrego. Preciso senti-la pesada para ao menos encorajar-me de cutucar a árvore ao lado.

Não sei para onde ir. Minhas raízes são tão presas ao solo que parecem uma precaução, um aviso, um cuidado da terra para não deixar-me ir. É como se o chão soubesse quem deve subir aos céus ou não. E, então, sinto que ele me quer perto, para não querer ir mais alto do que alcanço.

Sei também que devo seguir meus próprios instintos. No entanto, sua linguagem me é ininteligível. Numa hora, dizem: coragem. Noutra: cuidado. Tenho os joelhos ralados de teimar ir mais rápido do que devo ou andar por onde me atrevo. Mas certamente um dia reconhecer-me-ei entre sequóias e gramíneas porque, como cantou Cazuza, eu (também) mereço um lugar ao sol.

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