sábado, 6 de setembro de 2008

Te espero

A I Bienal Internacional de Poesia de Brasília (I BIP) me fez recordar algo de menina. Meus pais não têm vinis clássicos do Led Zeppelin ou dos Beatles, mas têm a jóia Capinan – O viramundo – 21 anos de tropicalismo. Lembro perfeitamente que gostava de ouvir uma faixa específica sentada ao chão e com o vinil na mão. Gostava de me emocionar junto a Capinan ao recitar Te esperei. No decorrer de sua leitura, sentia sua emoção e me emocionava junto como se vivesse o que ali escrevera. Uma pena não poder mais sentir a comoção, mas o LP guardado preserva a emoção.

Te esperei
(Capinan)

Te esperei vinte e quatro horas ou mais
De cada dia que eu vivi
Te esperei mais de sete dias por semana
Sem um só dia te trair
Te esperei mais de nove meses
Sem poder parir
Mais de doze meses cada ano
E te esperava até um novo século surgir
Te esperei na mesa
Te esperei na cama
Olhando as estrelas te esperei na lama
Te esperei bebendo
Te esperei calado
Embriagado e gritando por aí
Te esperei com fome
Te esperei sem nome
Uma vez chorando e outra sem sorrir
Num barraco numa esquina
Te esperei pelo mundo
Te esperei sempre assim
Num buraco sem fundo
Por dentro de mim
Mata derrubada maré poluída
Nas encruzilhadas pelas avenidas
Te esperei no sangue
Te esperei no mangue
Água derramada vida proibida
Hóstia consagrada pena colorida
Te esperei de gravata de luva e sapato
Com todo recato nua e mal vestida
Te esperei toda morte
Te esperei toda vida
No regato no esgoto
Te esperei no mato
o eclipse lunar
No luar neon na escura solitária
No clarão das luminárias
No ponto de encontro
Entre a bela e o monstro
No Raso da Catarina
Na profunda dos infernos
Te esperei nos ases
Te esperei nos ternos
Te esperei na tua
Te esperei na minha
Te esperei Clarice
Te esperei Virgínia
Te esperei tantos marços
E mais fevereiros
Esperei por inteiro e espero ainda
Neste novo janeiro te dar boas vindas

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