quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Congresso Internacional do Medo

O título já é suficientemente atraente. Baseado no homônimo poema de Carlos Drumond de Andrade o torna irresistível. E o espetáculo ainda supera as expectativas. A peça é o mais novo trabalho do grupo Espanca!, uma trupe de Belo Horizonte, que venceu com este trabalho o II Projeto de Co-Produção do Núcleo dos Festivais Internacionais de Artes Cênicas do Brasil.

Oito artistas no palco mantêm a platéia atenta durante 80 minutos e arrancam risadas surpreendentes em um diálogo trágico e cômico. Como em uma conferência, cinco deles apresentam-se sentados em uma mesa com seus respectivos copos d’água e plaquetas com seus nomes. No início, permanecem calados por desconhecerem os motivos de estarem ali.

De origens diferentes e idiomas estranhos, cada um discorre sobre as especificidades que conhecem. Para decodificar a língua em que falam, há uma tradutora que, ao final, torna-se dispensável, pois, apesar das diferenças, todos se entendem. Nascimento e morte ocorrem no palco como para enfatizar o medo que nos assombra e de que fala Drumond em seus versos.

É difícil descrever o espetáculo, e nem conseguiria. É preciso assistir para sorrir, pensar e aplaudir. É uma pena olhar para trás e ver cadeiras vazias, mas quem teve o prazer de estar na sala Martins Penna do Teatro Nacional de Brasília do dia 26 ao dia 28 de agosto sabe o quanto valeu a pena. É aconselhável levar carderninho e caneta, pois como a amiga que me acompanhou, ela gostaria de ter registrado algumas fantásticas expressões. Um exemplo: “brindar” na língua de um dos conferencistas é “estalar de vidros”. A criatividade é admirável.

A peça integra o Cena Contemporânea 2008 – Festival Internacional de Teatro de Brasília. Saiba mais no site

Grupo Espanca!

Formado em 2004, em Belo Horizonte (MG), o Grupo Espanca! conquistou o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) e o Shell de melhor dramaturgia em 2005, já com seu primeiro trabalho, Por Elise, que também recebeu, em 2006, o prêmio SESC SATED-MG de melhor espetáculo e melhor texto. Escrito e dirigido por Grace Passô, que também é atriz do espetáculo, Por Elise foi indicado ainda pela Revista Bravo! como um dos 100 melhores espetáculos de artes cênicas produzidos nos últimos oito anos no Brasil.

Congresso Internacional do medo
(Carlos Drumond de Andrade)

Provisoriamente não cantaremos o amor,
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos.
Cantaremos o medo, que estereliza os abraços,
não cantaremos o ódio, porque este não existe,
existe apenas o medo, nosso pai e nosso companheiro,
o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,
o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,
cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,
cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte.
Depois morreremos de medo
e sobre nossos túmulos nascerão flores amarelas e medrosas.

Foto: Calixto

Nenhum comentário: